“Temos que acabar com essa visão estereotipada de servidor público, uma visão tão equivocada quanto esse projeto, que traz práticas medievais de ameaça e punição. Podemos e precisamos ser avaliados. Mas esse projeto está na contramão da história. Trata-se de um projeto analógico, enquanto vivemos numa era digital”, argumentou o presidente do Fonacate.
Com informações de: Ascom/Fonacate
A avaliação de desempenho dos servidores públicos foi pauta de debate na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado Federal, na tarde desta terça-feira (2). O Projeto de Lei do Senado nº 116, de 2017, regulamenta o art. 41, § 1º, III, da Constituição Federal, sobre a perda do cargo público por insuficiência de desempenho do servidor público estável.
O presidente do Fonacate, Rudinei Marques, que compôs a mesa de debates, concordou com a necessidade de avaliação dos servidores. Porém, afirmou que o PLS 116/2017 é muito ruim: “Esse PLS tem falhas insanáveis. Depois de dois anos de debates, sequer foram apresentados estudos acadêmicos e científicos que tivessem fundamentado a proposta.”
Para o presidente, o texto tem duas décadas de defasagem em relação às práticas atuais de avaliação de desempenho e não prevê a participação da sociedade, como era de se esperar, em se tratando de serviço público. Citou, como exemplo, critérios que a Google, uma das maiores empresas do mundo, identificou em suas equipes vencedoras: segurança psicológica, confiabilidade, estrutura e clareza, significado–propósito e impacto.
“Temos que acabar com essa visão estereotipada de servidor público, uma visão tão equivocada quanto esse projeto, que traz práticas medievais de ameaça e punição. Podemos e precisamos ser avaliados. Mas esse projeto está na contramão da história. Trata-se de um projeto analógico, enquanto vivemos numa era digital”, argumentou Marques.
Rudinei disse, ainda, que é preciso desconstruir o discurso de que a máquina pública está inchada. E fez o comparativo demonstrando que a União hoje tem 630 mil servidores públicos civis, o mesmo número que tinha em 1991. Também registrou que o projeto é inconstitucional, pois a matéria deve ser de iniciativa do Executivo.
“O texto do PLS 116 não estabelece garantias constitucionais às carreiras de Estado, conforme prevê o artigo 247 da Constituição”, afirmou Marques, seguido, neste ponto, pelo diretor da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), Roberto Uchôa.
“Temos policiais que trabalham em delegacias que nem sequer têm banheiro ou teto. Como avaliar esse servidor, se ele não tem meios para exercer suas atribuições? E as carreiras de Estado que estão mais sujeitas a retaliações e perseguições? Na Polícia Federal temos um clima organizacional muito difícil. Qual é o parâmetro objetivo dessa avaliação?”, questionou Uchôa.
Segundo Uchôa, se o Estado quer cobrar qualidade, também tem que dar os meios, investir em capacitação, conhecimento. “Temos delegados, policiais que estão há mais de 20 anos sem curso para a melhoria do seu serviço, de inovação, de línguas que seja. É preciso pensar nessa contrapartida.”
Renata Vilhena, ex-secretária de Planejamento de Minas Gerais, apresentou o modelo de avaliação de desempenho aplicado no estado. “O intuito da avaliação sempre foi focar mais no desenvolvimento do servidor. Analisar o perfil que ele se adequa dentre as atividades que devem ser desenvolvidas. Às vezes, o profissional é muito técnico e não tem perfil para atendimento à sociedade. Por isso temos tido muito êxito com o projeto em Minas Gerais.”
O secretário de Gestão e Desempenho de Pessoal (SGP), Wagner Lenhart, defendeu a necessidade permanente de modernização na gestão pública. De acordo com ele, a avaliação de desempenho teria impacto em dois pontos: na melhoria e eficiência de trabalho dos servidores públicos e para criar um ambiente mais estimulante e saudável dentro do funcionalismo. “Precisamos criar uma cultura de feedback e deixar claro o que a Administração e a sociedade esperam do servidor.”
João Domingos Gomes dos Santos, presidente da Confederação dos Servidores Púbicos do Brasil (CSPB), apresentou comparações com as melhores experiências internacionais na administração pública. “No mundo desenvolvido constata-se uma relação direta entre a estabilidade dos servidores e a democracia. Exceto os Estados Unidos, todas as democracias do mundo preservam o instituto da estabilidade. Que fique claro que não me posiciono contra a avaliação de desempenho, mas contra esse projeto.”
Por sua vez, o senador Lasier Martins (PSD/RS), que foi o relator da matéria na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), afirmou que ninguém quer acabar com a estabilidade do servidor. “O objetivo do projeto é valorizar funcionários públicos eficientes.”
Já a atual relatora na CAS, senadora Juíza Selma (PSL/MT), disse que a proposta pode sim ser de autoria do Legislativo e que almeja regulamentar a avaliação de desempenho para todo o funcionalismo do Brasil.
O senador Paulo Paim (PT/RS), que presidiu os trabalhos, parabenizou a todos pelos debates de alto nível e pediu que as entidades apresentem sugestões de melhoria ao texto.
Rudinei Marques lembrou que em março desse ano entregou ao secretário Wagner Lenhart uma minuta de projeto do Fórum para regulamentar as carreiras exclusivas de Estado. E, por fim, colocou o Fonacate e suas afiliadas à disposição para debater essa regulamentação assim como a melhoria do texto do PLS 116/2017.
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