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O isolamento presidencial

Em épocas de grave crise como a que enfrentamos agora, nada é mais indispensável do que a união. O Presidente Jair Bolsonaro, no entanto, está seguindo outro caminho.

Com informações de: Gustavo Tavares*

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Desde que a Organização Mundial da Saúde (OMS) classificou a Covid-19 como pandemia, diversos países do mundo passaram a recomendar o isolamento social para suas respectivas populações. No Brasil, o governador do Distrito Federal foi o primeiro, entre seus pares, a suspender as atividades escolares.

Antes mesmo da classificação como pandemia, Bolsonaro e outros chefes de Estado (Donald Trump, principalmente) minimizavam os efeitos da doença. O presidente brasileiro chegou a participar de uma manifestação popular que ele próprio havia desestimulado dois dias antes, em rede nacional.

Na contramão de líderes internacionais que mudaram sua postura diante da nova situação, Bolsonaro dobrou a aposta, levantando a bandeira de que “o Brasil não pode parar”.

Impulsionado por questões eleitorais que se impuseram já no ano passado, o Presidente da República seguiu na linha do confronto com governadores desafetos e antigos aliados, especialmente João Doria (PSDB/SP) e Wilson Witzel (PSC/RJ). A grande imprensa, adversária de primeira hora de Bolsonaro, não abandonou a hostilidade mútua e passou a vocalizar, por meio de editoriais e cobertura ostensiva, as reações contrárias ao Presidente.

Pela primeira vez, o apoio de boa parte da população a Bolsonaro começou a enfraquecer e a classe política começou a admitir abertamente o afastamento do mandatário. A deputada estadual Janaína Paschoal (PSL/SP) pediu na tribuna da Assembleia Legislativa que Bolsonaro se afastasse da Presidência da República e assumisse o seu vice, Hamilton Mourão. Lembrando que (1) de afastamento a deputada entende e (2) ela seria escolhida vice-presidente, se não tivesse recusado o convite.

Para engrossar um pouco mais o caldo, no início desta semana, Bolsonaro decidiu fazer um pronunciamento em defesa do isolamento vertical, pedindo às pessoas que voltassem a trabalhar. Não fosse o suficiente ir na contramão das práticas adotadas pela maior parte do mundo e endossadas por autoridades do seu próprio governo, o Presidente não fez nenhuma menção às vítimas fatais da Covid-19 e voltou novamente a falar em “gripezinha”.

Esse pronunciamento levou o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), a anunciar sua ruptura com o Governo Federal. É verdade que Caiado chegou a recriminar aqueles que participaram das manifestações em apoio à presidência, mas, mesmo naquele momento, o governador goiano reafirmou seu apoio a Bolsonaro. No entanto, após o pronunciamento de terça-feira (24/03), Caiado disse que “não tem mais diálogo com esse homem”.

A situação do presidente se torna ainda mais crítica diante dos comandos contraditórios que seu governo tem emitido. De um lado, estão o Ministério da Saúde emitindo alertas à população referente ao isolamento e os demais órgãos do governo anunciando diversas medidas econômicas contra a crise e, de outro lado, existe o discurso do presidente, fazendo crer que nada disso é tão grave assim. Isso evidencia divisões profundas dentro do governo, que podem ser danosas para a população.

Na mesma noite do mencionado pronunciamento, o comandante do Exército fez um pronunciamento enigmático, para dizer o mínimo. O pronunciamento era em alinhamento ao Presidente da República ou queria indicar outra coisa?

Na reunião que o presidente teve com os governadores do Sudeste, a situação ficou ainda mais drástica quando Bolsonaro e João Doria começaram a bater boca. No entanto, a reação mais emblemática naquele momento foi a do vice-presidente, que balançou a cabeça em tom de reprovação àquela discussão absolutamente desnecessária.

Diante do isolamento presidencial, imposto por adversários e ex-aliados e alimentado pelo próprio presidente, é difícil escapar do seguinte questionamento: será que o afastamento do presidente se tornou inevitável e a única coisa que o mantém no cargo é justamente a situação de pandemia em que nos encontramos?

É uma pena que esse tipo de discussão tenha sido levantado no momento como esse, mas é ainda mais lamentável que não consigamos, enquanto nação, deixar nossas diferenças de lado para nos unir em prol de uma saída razoável.

*Integrante da Metapolítica (empresa que faz Assessoria Parlamentar para o Fonacate), bacharel em Ciência Política pela Universidade de Brasília.

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